UM COMENTÁRIO SOBRE A REPRODUÇÃO: ELEMENTOS PARA UMA TEORIA DO SISTEMA DE ENSINO – PIERRE BOURDIEU – JEAN CLAUDE PASSERON

Reprodução


Pierre Bourdieu nasceu no vilarejo Frances de Denguim no dia primeiro de agosto de 1930 e começa sua carreira acadêmica em 1951 e gradua-se em Filosofia em 1954, em seu trabalho ele aborda temas como: educação, cultura, literatura e politica. Dentre suas obras, vamos nos centrar em uma publicação de 1970, “A reprodução”, onde ele faz uma analise do sistema educacional francês daquele período, e também de outras épocas, comparando-o com sistemas de outros países detectando semelhanças e divergências. Em nosso trabalho, abordamos o capítulo III intitulado “Eliminação e seleção”, onde o que está sob analise é a forma como a avaliação é aplicada e quais seus verdadeiros objetivos, de que maneira o exame perpetua e cristaliza certo tipo de conhecimento que na verdade apenas garante os interesses e objetivos de uma classe dominante.

O EXAME NA ESTRUTURA E NA HISTÓRIA DO SISTEMA DE ENSINO

Apesar de Bourdieu se referir ao sistema de ensino francês, isso não impede de localizarmos pontos em comum ao nosso próprio modelo de educação, o mesmo esquema de repetição e interiorização de valores, realizado através do poder simbólico, pode facilmente ser identificado em algum grau em qualquer modelo de ensino, e sendo a educação uma forma de capacitar o indivíduo a vida social, reproduzindo as normas e os valores de uma classe dominante, o exame é a confirmação da perpetuação da transmissão desses valores. O exame não tem por objetivo acompanhar o desenvolvimento das potencialidades do indivíduo de forma a valorizar suas particularidades e respeitar seus limites, o exame, prova, teste, seja lá como você chame, é a forma de se ter certeza de que o que é ensinado em sala de aula está sendo assimilado de acordo com o interesse da classe dominante, e dessa forma o indivíduo não tem opção de qual carreira seguir, resta a ele escolher entre as que estão postas, e todas elas têm grande importância na manutenção da ordem social e consequentemente nas relações de poder e na desigualdade entre classes.

A crítica feita por Bourdieu, sobre o sistema educacional, serve para todas as sociedades em todas as épocas, pois sempre que se quis instituir um novo pensamento ou afirmar uma identidade nacional, se usou da educação para legitimar e divulgar tais pensamentos, independente de ser um governo democrático ou autoritário. Mas o que se critica no livro, mas precisamente no capítulo III, é a maneira como a avaliação é concebida e o fim ao qual ela se reserva, não se procura por exemplo uma resposta criativa, uma interpretação digna de atenção, tudo se resume a mera reprodução, nada mais que gabaritos e múltiplas escolhas, tudo aquilo que fugir do padrão é considerado erro, só resta a você se enquadrar ao molde, seu valor é equivalente a sua capacidade de adaptação, seu sucesso ou não vai depender disso.

ELIMINAÇÃO E SELEÇÃO - EXAME E ELIMINAÇÃO SEM EXAME

O sistema de ensino traz uma aparência independente, porém, a verdade é que na sua formação existem características próprias para uma determinada finalidade na vida social e individual. A atuação do ensino com esse fim; proporciona no meio social uma seleção e hierarquização na sociedade. Segundo o Bourdieu; na sua análise ele identifica na estrutura social, os fatores externos que atuam, proporcionando a compreensão da vida particular das pessoas e, inclusive a verdadeira finalidade do “Exame”. Já na questão Seleção, Bourdieu aborda que a taxa de êxito escolar, está diretamente ligada à questões socioeconômicas; pois o fato do indivíduo se sobressai ou fracassa no êxito escolar, depende de fatores como: nível social, grau e tipo de classe, se é alta, baixa ou popular. Nesse quanto maior for as condições financeiras de um indivíduo, maior oportunidades educacionais ele terá; quanto menor for a situação financeira, aumenta também as condições de exclusão e diminui as oportunidades sociais e educacionais desse indivíduo. As condições e probabilidade de êxito escolar, sucesso profissional está diretamente ligado a esses fatores, que atuaram diretamente e indiretamente na vida de cada ser humano.

O exame funciona como uma espécie de auto-eliminação atingindo diretamente a vida da classe popular. Isso ocorre quando os alunos de classe popular, nem chegam mesmo a fazer o exame , ou seja, a desistência acontecem antes mesmo que o indivíduo ascende de período. Bourdieu exemplifica nos casos de alunos que não se matriculam para o próximo período, então acontece a eliminação se exame, a desistência para o ciclo seguinte não acontecem sem motivos; mas, existe uma série de fatores sociais que contribuem para que o indivíduo desista refletindo assim também na sua vida futura. Tendo em vista, que o fator eliminação sem exame proporciona a eliminação, antes mesmo que o indivíduo passe pelos exames educacionais eliminatórios, é o caso quando há concorrência por vaga no nível superior. Bourdieu diz que o exame vem retificar, gerando outro fator que é a auto-eliminação causando a exclusão social antes mesmo da eliminação formal.

A consequência é que se cada vez mais as desigualdades sociais aumentam e as relações dessa força presente na estrutura social. Portanto, a escola funciona camuflando esse sistema de eliminação e seleção, contribuindo assim para o fortalecimento dessa estrutura de hierarquia social que se traduz na hierarquia estabelecida pelo sistema de ensino; assegurando a compreensão das desigualdades sociais, e dificulta cada vez mais o êxito do indivíduo que vive na classe popular. A escola traz em si uma espécie de função técnica de produção e comparação das capacidades individuais, selecione-o através de um sistema conservador, que assegura certos privilégios a poucos na sociedade. Dentro desse contexto de desigualdade social; Bourdieu, deixa evidente que a probabilidade que um aluno tem na vida educacional de ascender de período, ingressar no ensino superior e obter as melhores profissões é algo que dependente também da classe social relacionado à função do ensino. Com isso, o sistema pedagógico de ensino que reproduz as relações de poder, para um determinado grupo social. Como mecanismo de conservação e reprodução em todas as áreas da atividade humana entre ela o sistema educacional.

ELIMINAÇÃO E SELEÇÃO: SELEÇÃO TÉCNICA E SELEÇÃO PESSOAL

Bourdieu trata da dissimulação da função social do sistema de ensino, de legitimação das diferenças de classe sob sua função técnica de produção das qualificações, de como não se pode ignorar as exigências incomprimíveis do mercado de trabalho. Essa seleção técnica é na verdade seleção social, ou seja, conduz as classes sociais mais desfavorecidas a auto a auto eliminarem-se e a auto excluírem-se devido aos baixos níveis de esperança. O exame que é considerado como “o momento da verdade” apenas justifica a exclusão e tem como finalidade manter o status. Há indivíduos qualificados e aptos, mas as classes que detêm o monopólio, sempre tiram proveito da certificação. As sociedades modernas atribuem à escola a produção e garantia de indivíduos qualificados, ou seja, bem aptos às exigências da economia. Busca-se um sistema de ensino de acordo com ideologias e tradições, visando um diploma o que segundo ele é raro, pois é esse diploma que legitima e dá acesso ao mercado. Bourdieu, também trata das profissões que são ocupadas por títulos diferentes e com remunerações desiguais por indivíduos que se diferenciam pelo grau em que foram consagrados pela escola. Todas as organizações possuem esses substitutos, que por não terem um título, trabalham em condições subalternas, mesmo sendo eles eficazes e indispensáveis. A escola tem papel fundamental para a reprodução da ordem já estabelecida, pois ela tem o papel de dissimular a função que desempenha.


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