COM QUANTAS TESES SE CONSTRÓI UMA EPISTEME? ou como se forma a identidade nacional?

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A GESTAÇÃO

O mito fundador de uma nação pode se originar a partir de um signo ou de determinada característica que proporcione sentido de unidade e de referencia para que a partir dele, mesmo sabendo de sua natureza fictícia, se formule um projeto de nacionalização, justificando assim sua soberania. O movimento indianista se achava apto para organizar tal gênese, primeiro o arcadismo buscou enaltecer a supremacia do colonizador sobre o “selvagem”, justificando sua subordinação. Depois o indianismo romântico propôs a construção de uma origem que não teve o compromisso de ser fiel ao contexto e as especificidades da nascente nação, preferindo enaltecer alguns pontos em detrimento de outros que realmente soariam como mais próximos a nossa condição. Ao invés disso, seguindo o exemplo do Romantismo europeu, criou-se uma fábula, uma epopeia com seus heróis e respectivos feitos históricos. Assim o personagem Peri, da obra de José de Alencar encarna todos os atributos do cavaleiro medieval, reforçado pelo fato de ele desejar ser batizado como cristão, dai o sentido do termo “sacrificial”, pois é preciso abrir mão de sua cultura e de seu povo e assimilar os costumes do colonizador para que se torne “digno”, assim o brasileiro é fruto do “enobrecimento” nativo através da cultura européia.

O dilema dos intelectuais, no fim do século XIX, assim como o dos indianistas, era o da construção da identidade nacional, o país encontrava-se em um período de transformações como, por exemplo, a abolição da escravatura e chegada dos imigrantes. O darwinismo social e o evolucionismo ditam o rumo da analise cientifica daquele período, mas para se pensar a realidade brasileira não se poderia ter o contexto europeu como norteador, mas apesar disso, políticas de “branqueamento” foram desenvolvidas para combater a mestiçagem, que foi considerada o grande mau não só do Brasil, mas de toda América latina. Nina Rodrigues, por exemplo, operava com as ideias eurocêntricas típicas de seu tempo, segundo ele, no Brasil as relações sociais não se constroem em si mesmas, mas a partir do lugar social que os indivíduos ocupam.

Já na abordagem de Gilberto Freyre é valorizada a mestiçagem brasileira, segundo o autor, ela foi um elemento positivo para o processo de colonização do Brasil, e foi essa visão de Freyre, que deu ao povo brasileiro uma identidade. Desse modo, a miscigenação enquanto capacidade de integração racial, étnica e cultural passa a constituir um fator de originalidade. Dessa forma o Brasil se eleva a uma condição de país mestiço composto pela multiplicidade de culturas vista como positiva para a nação. Por outro lado a questão levantada por Da Matta remete, segundo ele, a essa falsa noção de harmonia, pois na verdade devido a nossa herança lusitana, desenvolvemos um “Racismo à brasileira” onde não nos aceitamos realmente e nem nos reconhecemos enquanto originados das três raças. Em minha opinião, a declaração do jogador Neymar, sobre o fato de ele nunca ter sofrido preconceito por “não ser negro”, remete ao fato de que nosso individualismo não nos permite enxergar uma forma de eliminar as desigualdades. Em toda parte escutamos o discurso politicamente correto de que não existe preconceito no Brasil e que somos uma “Democracia racial”, mas o dia a dia nos mostra exatamente o contrário.

OS ANOS CINQUENTA...

O Instituto Superior dos Estudos Brasileiros (ISEB) foi criado anda no governo de Café Filho pelo Decreto nº 37.608, de 14 de julho de 1955, como órgão do ministério da educação e cultura. O ISEB foi um dos centros mais importantes de elaboração teórica de um projeto que ficou conhecido como "nacional-desenvolvimentista", e durante o governo de Juscelino Kubitschek o conceito de raça cede lugar ao de cultura, sendo remodelado nos anos 50 do século XX, no qual estes analisaram as questões culturais num âmbito filosófico e sociológico, influenciados pelas ideias de Hegel e Marx.

A criação do Centro Popular de Cultura (CPC) tem lugar no governo de João Goulart, e tem origem de uma dissidência no grupo paulistano chamado Teatro de Arena, além da colaboração de intelectuais como Carlos Estevam, então sociólogo do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), com influência do Movimento de Cultura Popular (MCP), fundado no Recife ligado a Secretaria de Educação do Município, além é claro do apoio da União Nacional dos Estudantes (UNE). Carlos Estevam afirma que antes de qualquer coisa é necessário distinguir com clareza as três formas de arte na concepção de Carlos Estevam que seriam: A arte do povo, que seria predominantemente um produto das comunidades economicamente atrasadas e floresce de preferência no meio rural ou em áreas urbanas que ainda não atingiram as formas de vida que acompanham a industrialização; A arte popular que por sua vez seria mais apurada e com finalidade de oferecer ao público um passatempo, não se colocando para ela jamais o projeto de enfrentar os problemas fundamentais da existência e por último a arte popular revolucionária Afirma que seu sentido revolucionário não está na apresentação explícita de soluções para os problemas sociais, nem na formulação de palavras de ordem que signifiquem uma instigação direta para a prática política concreta e imediata, ela acredita que seu papel revolucionário é satisfatoriamente desempenhado na medida em que ela reflete, de maneira não tendenciosa as relações do homem com o mundo e consigo mesmo e consegue reproduzir num quadro fiel os fatos e as estruturas possíveis de serem captadas pela razão e pela sensibilidade.

O golpe militar de 1964 traz consigo o fechamento do CPC, a prisão de artistas e intelectuais, e o exílio político. Mesmo assim, ecos do projeto cepecista reverberam em iniciativas posteriores, como no célebre show Opinião, em 1964, de Oduvaldo Vianna Filho, Armando Costa e Paulo Pontes, que reúne Zé Kéti, João do Vale e Nara Leão. Assim cada período histórico possui a sua episteme, em poucos anos talvez tenhamos outro discurso sobre questões tanto universais como as do nosso cotidiano, por isso não se envergonhe em mudar de opinião ou então de reconhecer que em algum momento você esteve equivocado sobre um determinado ponto em suas formulações, o que importa é sempre evoluir, ou então relaxe, alguém uma vez disse (não me lembro quem) que as vezes é melhor ser feliz do que estar certo!

E você o que acha?

Comentários

  1. Sim, Nina Rodrigues buscou a identidade do Brasil. Passados mais de cem anos, os seus críticos tentam nos impor uma anti-identidade.

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